O desabrochar de mais um soldado...

Crescer é um verbo estranho. Digo isso ao deixar de lado os tamanhos e os números que preconceituosamente deveriam ilustrar minhas vontades e idéias, mesmo que a idade não seja um adjetivo. E mesmo assim continuo tendo meus pensamentos enquadrados no que pensam ser a definição da palavra JUVENTUDE.

Por que este substantivo, que serve para ilustrar um período entre a infância e a idade adulta, é usado na grande maioria das vezes como adjetivo? Procuro um rótulo ao me olhar no espelho. Encontro reflexos de atitudes que me levam a uma possível explicação.

Observe à sua volta... Olhos distintos, o mesmo cabelo, diferentes narizes, os mesmos assuntos (ou falta de), vozes de tons variados e a mesma necessidade de inclusão. O que nos foi imposto como certo, bonito e melhor transformou-nos em massa homogênea. O diferencial de agora é a COR das camisetas, ou do cadarço do tênis... A propósito: não corras o risco de perder o seu lugar na mesa do Bar do Júlio pra alguém que comprou o tênis da moda antes de ti, vai logo derramar tua personalidade em uma quantia de dinheiro!

É divertido pensar que demos permissão para que nos rotulassem. Contraímos uma espécie de paralisia mental que não nos permite sair dessa massificação. Nem ao menos se pode enxergar à volta...

Sinto que meu corpo cresce, mas minha mente estancou, e vai se tornando pequena.
Espera. Já não sei mais quem estou vendo do outro lado do espelho...
Tiro minhas roupas e jogo-as longe.
Desarrumo o cabelo.
Abro a cortina...
Já é primavera.

(texto publicado no Jornal da CACA)

Eles passarão, e eu passarinho!

É complicado tentar tomar as rédeas da vida.
Ela, em si, é uma égua mansinha, mansinha...
O problema é quem está de fora.
Eles falam muito alto, acham que eu não consigo fazer sozinha,
ou querem que eu use as suas rédeas.
Assim o bichinho fica estressado!
E haja fôlego para que eu messa as duas pontas do laço do tamanho certo...
Já tentei explicar pra esses peões que é tentando que se aprende,
mas eles seguem pensando que eu não cavalguei em dupla o suficiente
para que agora assuma o controle do animal.
Ou quem sabe eles estão receosos que tanto tempo já tenha se passado...

Espero que ao menos um dia eles se dêem conta que cada um tem seu método de montaria.
Se o meu problema é a altura do estribo, que pra ti nunca foi dificuldade, não quer dizer que eu esteja exagerando, ou fazendo corpo mole.
A verdade é que é necessário que olhemos pro lado com atenção -do contrário poderíamos usar viseiras de cavalo sem maiores problemas.


Party in the USA...

Estamos brincando de pega-pega.
A vida passa por mim todas as vezes possíves,
e algo me congelou nos meus primeros passos.
Por que é que chove nos meus campos de morango?
Pra que tanta tempestade na minha cabeça se está tudo correndo bem? Bem.. Bem...
Veja bem: As experiências dependem de como os olhos se abrem pelas manhãs.
Alguém troca um quilo de morango por dois olhos fechados?
Tá... Pode ser quantos quilos tu quiser. Meus campos não são finitos, mas essas tempestades conseguem me tirar uns bons pedaços.
Sempre achei que minha terra fosse forte.
Seria minha a culpa? Botei adubo de menos? Ou a culpa é mesmo do frio intenso -que mata também minhas borboletas?

Queria não ser do avesso. Não jogar o meu dentro pra fora com tanta facilidade. É estranho eu não ser vazia, mas precisar de muito mais pra me sentir completa, ou completamente algo. Eu já não fui neutra o bastante?
Aí está o problema. Eu não sei ser bege. Nasci vermelha, gritante... da cor do sangue que não escorre, a não se por dentro. As vezes posso ficar preta, azul, amarela... mas nunca fico bege.

Vim buscar água numa pedra. Saí de casa com um mundo me esperando, e fui recebida por um buraco infinito. Quando mais eu tento pensar que não estou caindo, mais minha consciência se revolta. Esse buraco ao menos tem profundidade.

Se falarmos de humanos talvez descobriremos o conceito de raso e fundo.
Eu não saí de casa pra regredir meus dias. Não saí de casa pra ficar no raso.
Onde foi que eu errei?

Palavras me resgatam...

Mas o contraste não me esmaga — liberta-me; e a ironia
que há nele é sangue meu. O que devera humilhar-me é a
minha bandeira, que desfraldo; e o riso com que deveria rir
de mim, é um clarim com que saúdo e gero uma alvorada em
que me faço.

A glória noturna de ser grande não sendo nada! A majestade
sombria de esplendor desconhecido...

(Bernardo Soares)